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segunda-feira, 16 de março de 2015

Re-escrevendo a Metáfora Paterna (III) - “Pai” de Freud a Lacan

Quando Lacan constrói o novo estatuto do objeto como resto, ele modifica a maneira de abordar a castração. A castração construída por Freud em Totem e Tabu e o complexo de castração, consequência do Complexo de Édipo, é abordada de forma diferente depois que se construiu o objeto “a” como resto. Do que se trata, como já foi dito, é de uma perda real. A entrada do significante produz uma perda real. Dai podermos dizer: "O pai, o pai real, nada mais é do que o agente da castração". Somente a partir desta nova perspectiva é que se pode afirmar o pai real como impossível. 
Acompanhemos "o Pai" neste caminho de Freud a Lacan: o pai morto freudiano era um pai impossível e os teóricos da época se contentaram com isso. Esse pai morto, impossível, não há como acessá-lo. Ele é correlativo ao final do analise como o encontro com o rochedo da castração. Esse pai morto freudiano, como impossível, Lacan o diz com todas as letras: está destinado a mascarar o pai real como agente da castração. É o pai guardião do gozo, o Pai que a Igreja cultua: um Pai-Deus que goza e que se sustenta de todo um ritual feito para preservar esse lugar do pai morto. 
Um passo importante acontece quando Lacan estabelece o pai como operador estrutural, efeito de linguagem. O pai lacaniano, ao mesmo tempo em que interdita e legisla uma lei, sustenta um lugar onde um desejo pode acontecer. Um pai que aponta, também, para um gozo possível, na medida em que ele se dirige a uma mulher. Esta é a conseqüência de uma operação que só se conclui se o pai foi capaz de “afrontar o gozo de uma mulher”, fazendo dessa mulher causa de seu desejo, separada da mãe. Causa que está articulada no campo do Outro. Está articulada na linguagem, mas não é o Outro. 
Têm-se, portanto, um pai mítico, escrito por Freud em Totem e Tabu, o pai que ao morrer passa a ser o guardião do gozo ao qual ninguém mais tem acesso. Ele encarna o gozo só para ele, à tribo totêmica resta a lei. Esse pai é um pai de acesso impossível, e por ser assim ele mascarou a sua própria ação enquanto agente da castração. Por outro lado tem-se um pai efeito da linguagem. Um pai real agente da castração e que aponta, por sua operação um objeto causa de desejo, abrindo espaço para que a pulsão possa percorrer seu trajeto. Este pai que se pode dispensar, mas à condição de dele se servir.
Para concluir, podemos dizer que o trajeto percorrido, partindo da metáfora paterna, passando pela construção do objeto “a” no Seminário “A Angústia” até a construção dos Discursos nos diz como Lacan pode ir do significante à letra, da enunciação ao dizer, do objeto causa do desejo ao objeto resto, excesso de gozo. Com isso pode-se desmascarar esse pai impossível com o qual muitos esbarraram ao final suas analises, via identificação, no rochedo da castração. Esse trajeto nos diz da pluralização dos Nomes-do-Pai, na medida em que o nome próprio, singular a cada sujeito, é a conseqüência da inscrição do Nome-do-Pai a partir do resto. Resto que antecede o sujeito: afinal cada sujeito é, de início, determinado como objeto pequeno a, sendo assim resposta do real.  


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