O que lhes trago hoje é uma re-elaboração de conceitos que operam na clínica: Psicanálise pura, psicanálise aplicada e psicoterapia.
É a claudicação do saber, da crença no sintoma que abre um espaço para que um endereçamento possa ser feito a um Outro lugar, na esperança de que o estranho possa ser decifrado. Sim, decifrado, por que o sintoma, sendo a primeira mensagem cifrada, plena de sentido, traz em si o ciframento do gozo, que se apresenta como um ponto sem sentido, como um estranho, como um "x" no caminho do sujeito. Miller nos lembra a propósito do sintoma e a crença que sustenta este sintoma: “Lacan reenvia o sintoma analítico a um fato de crença. Como ele diz, acredita-se. Acredita-se que isso pode falar e que isso pode ser decifrado. Acredita-se no sentido.
Esse "acredita-se" acentua a relatividade transferencial do sintoma. "O sintoma, acredita-se nele", que tanto surpreendeu na sua formulação, é a conseqüência do sujeito suposto saber.” Este é o momento de claudicação, portanto, é quando se instala, no ponto de inconsistência do Outro, um Sujeito a quem se supõe um saber sobre o que seria a sua verdade. Aqui também acrescentaremos uma passagem importante: “Quando se diz "suposto", ninguém supõe. Lacan tinha insistido nisso. O sujeito é suposto, mas ninguém supõe, ele é suposto ao significante.” Para que isto possa acontecer, uma escolha, forçada sem dúvida, deverá ser feita para que um significante qualquer venha se alojar aí, onde o saber falhou. Este significante será, ele mesmo, integrante do sintoma que se constituirá neste momento. É a transferência que, agora, pode sustentar estrategicamente a direção do tratamento, enquanto signo de um amor que possibilitará um giro de quarto de volta no discurso. Amor que se sustenta, exatamente na crença transferencial que vem na trilha da instalação do que se chama sintoma analítico. “O amor visa o sujeito”. Esta é a fórmula lacaniana que se contrapõe à fórmula do amor narcísico que visa apenas a imagem.
No entanto, para que as coisas possam continuar caminhando em função da política do tratamento, é fundamental que este lugar ao qual se dirige o analisante em função do amor de transferência seja "cadaverizado", para usar uma expressão que Lacan utiliza em "A coisa freudiana", e que seja anulada a própria resistência do analista, o que equivale dizer que ele não vai simplesmente insistir na significação que o paciente tenta fazer valer nas suas proposições. Este ponto abre a possibilidade de inserir uma passagem que, acredito, é o eixo da tese defendida por Miller: “É preciso primeiramente perceber que é justamente porque se define o real como excluído do sentido que se pode colocar sentido sobre o real. Eu não digo ”no real", eu digo "sobre". O "nó" supõe um campo, e não existe o “dentro” da rodela de barbante.” E ele continua na construção de um importante algoritmo que indica a disjunção entre o Simbólico e o Real que se esclarece a partir da introdução da teoria dos nós que nos indica que os dois “podem permanecer disjuntos entanto separados”: “Pode-se, sobre o real, colocar o saber, mas na perspectiva do real como excluído do sentido, aí colocar saber não é jamais senão uma metáfora. Escrevemos o sentido sobre o real:
Sentido
Real”
Se tomarmos o Grafo do Desejo e colocarmos a claudicação do sintoma em s(A) teremos, no vetor que daí parte, um endereçamento ao (A), enquanto lugar. Se o analista se deixa levar pelo sentido que lhe é proposto, exaltando o Sq, o traço que lhe foi atribuído, ele estará favorecendo uma identificação e esvaziando sua palavra num discurso do convencimento que só vai se prestar a abrir caminho para a circulação no andar inferior do Grafo: s(A) ----- (A) ----- i(a) --- (m). No entanto, para que uma análise possa acontecer é fundamental que, no amor de transferência que se instala, pelo menos um dos dois saiba que não tem o que lhe está sendo atribuído. Isto é o que se espera de um analista: que coloque em operação o desejo do analista que foi constituído em análise.
Nesse artigo, o autor indica de maneira precisa a importância do reconhecimento, por parte do analista, de seu lugar, para que seja possível que uma análise aconteça.Como nos diz Miller, no andar inferior do grafo do desejo, corre-se o risco de se resvalar para o campo das psicoterapias, onde o discurso da maestria impera; entretanto, este autor (Miller) pondera que também pode-se considerar esse andar como sendo o tempo das entrevistas preliminares.
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