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terça-feira, 23 de abril de 2013

Ler o escrito "A direção do Tratamento..."


Bem, com as referências publicadas anteriormente, vamos ler A Direção do Tratamento e os Princípios de seu Poder (Lacan, J.  In Escritos, pág.591-652 ) verificando o que modificou e o que ainda permanece capaz de fazer operar uma análise, hoje. Vamos tentar extrair do Lacan de 1958 a presença do que ele produziu depois. Este é um exercício de pesquisa e de trabalho que podemos denominar uma clínica do texto.

Apresento-lhes outra referencia, além das já mencionadas anteriormente,  que encontro no Seminário Silet[1] desenvolvido por J.A.Miller em 1995 e que já nos fornece uma primeira chave de leitura.

A direção do tratamento..." é um texto, pode-se dizer, onde a libido está perfeitamente ausente, que põe o desejo no primeiro plano da prática analítica e consuma,  pois triunfo do desejo.

Isto quer dizer que, ao percorrermos o texto não vamos encontrar nenhuma referência ao gozo, já que libido é  um dos nomes do gozo, para Lacan. Vamos ter que localizar nesse texto, onde é que está a referencia ao gozo.

Este é um texto onde Lacan vai tentar fazer acontecer o triunfo do desejo. Lacan ainda tentava sustentar a primazia do significante como possibilidade de se preencher as lacunas do inconsciente. Eu disse ainda porque já se podem perceber movimentos na direção de escutar o resto que a articulação significante produz. Esta referência ao momento histórico do texto é importante. Quando trabalhamos um texto de Lacan não se pode, em hipótese alguma, deixar de ter em conta duas coisas: a primeira delas é o lugar do texto no percurso de Lacan. A segunda, mas nem por isso menos importante é saber quem foi o interlocutor de Lacan naquele momento em que o texto estava sendo escrito ou o seminário sendo ditado. São referencias que, dentro do nosso conhecimento, estaremos passando a vocês todo o tempo.

Lacan considera que o ponto de partida de seu ensino foi 1953. Neste momento ele diz o primeiro não à instituição que o cerceava, vamos dizer assim. Nesta ocasião ele faz uma conferencia que conhecemos com o nome de Relatório de Roma, ou Discurso de Roma, cujo título é: Função e Campo da Palavra e da Linguagem em Psicanálise[2]. Um relatório importante. Quando ele foi apresenta-lo no Congresso da IPA, disseram-lhe que não havia espaço para aquele texto na programação. O que ele fez? Ele conseguiu um salão perto de onde as reuniões do Congresso estavam acontecendo, abriu as portas e encheu a sala com não importa quem quisesse ouvi-lo.

Neste texto Lacan introduz a função e o campo da palavra e da linguagem. Ele introduz o poder da palavra, que estava sendo esquecido pelos psicanalistas da época e, a partir daí começa a examinar a função da intersubjetividade na prática analítica. Porque ele acreditava que à palavra plena como resposta do analista à palavra vazia do analisante, poderia produzir uma modificação subjetiva nos dois. Ele sustenta a teoria da intersubjetividade, naquilo que pode aprender de Kojéve sobre Hegel. É bem possível que o final da análise, naquele momento, estivesse contaminado pela possibilidade de encontrar o saber absoluto. Em outras palavras, que se pudesse recobrir o real pelo simbólico. Isto se expressa em sua definição de um final que incluía a subjetivação da morte. No entanto, uma releitura deste, assim como de outros textos contemporâneos já demonstram a impossibilidade de uma proporção sexual. Mas Lacan acreditava por demais no simbólico.

É nesse texto, A Direção do Tratamento... que ele começa seu questionamento sobre a teoria da intersubjetividade, exatamente quando já não mais acredita que o significado pudesse ser totalmente recoberto pelo significante.

É no final do texto, no entanto que vamos ver escrito que o desejo vence. Ali ele vai fazer referência ao final da análise como estreitamente ligado à questão de ter ou ser o falo. O falo enquanto significante do desejo. Leio a penúltima frase do texto:

...é preciso que o homem macho ou fêmea, aceite tê-lo e não tê-lo a partir da descoberta de que não o é.[3] É a dialética do ter e do ser que está em jogo.

E o leitmotiv de Lacan, em A direção do tratamento é: Cito Miller: é preciso preservar o lugar do desejo.
[4]

É o que Lacan diz[5], página 601, Não devemos nos enganar quanto ao lugar do desejo, ou, página 612, não devemos desconhecer o verdadeiro lugar onde se produzem os efeitos da técnica.

Portanto, dito de uma outra forma, trata-se de interpretar o desejo e seu significante, o falo.

O Sujeito entra em análise sustentando a possibilidade de vir a ser o objeto do Outro. Todo o desejo do sujeito sustenta uma interpretação que ele faz do desejo do Outro. Ser o que o Outro quer que ele seja, para ser por ele amado. É uma coisa bem simples. Essa é a dialética que sustenta a entrada em análise,  Para que no final o sujeito perceba que esse Outro, é um Outro barrado, e portanto, não tem. É a dialética entre ter e ser. A questão não é mais ser, a questão é se tem ou se não tem.

Isso quer dizer É preciso sempre interpretar na direção da falta, é preciso sempre interpretar em direção ao nada, é preciso, de certa maneira, visar e mostrar o nada. [6]




 Miller, J-A   Silet - Jorge Zahar Editor Ltda, Rio de Janeiro, 2005, pag. 218
[2] Lacan, J. , Função e campo da palavra e da linguagem em psicanálise, em Escritos, Jorge Zahar Editor Ltda, Rio de Janeiro, 1998
[3] Lacan,J. A direção do tratamento ... in Escritos, Jorge Zahar Editor Ltda. Rio de Janeiro. 1998,
[4] Ibid., p.633
[5] Ibid., p.601, 612
[6] Cf. A direção do tratamento...  , p.641

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